6.26.2005

A "ESQUERDA EUROPEÍSTA" TEM QUE PASSAR AO ATAQUE

Neste momento, a “direita europeísta” está derrotada – a “Constituição para a Europa” está morta, acabou.


No entanto, o mais difícil começa agora: o “Não” foi a vitória de para aí umas três correntes distintas: a “esquerda europeísta” (os defensores da Europa Social – em Portugal, o Bloco), os nacionalistas (em Portugal, o PCP, o PND e o PNR), e os defensores da “Europa-área-de-comércio-livre” (em Portugal, o melhor exemplo serão blogs ultra-liberais, como o “Blasfémias” ou “O Insurgente”, e talvez o Pacheco Pereira).


Ora, o campo “soberanista” parece já estar a aproveitar para passar ao ataque (ver as declarações de um ministro italiano de que a Itália deveria sair do euro). Nós, pelo contrário, parecemos numa posição totalmente defensiva (contra a “Constituição”, contra a Directiva Bolkenstein, etc.), que, por si só, mal se distingue da de muitos anti-europeístas.


Assim, para a “esquerda europeísta” marcar a sua posição, temos que começar a desenvolver campanhas “ao ataque”, começando já a apresentar propostas para a tal “Europa Social”. Por exemplo, poderíamos exigir um “abono de família europeu”, pago pelo Orçamento da UE (o que não impediria qualquer estado-membro de pagar mais qualquer coisa aos seus cidadãos, se assim o entendesse). Esse género de propostas teria logo uma vantagem: os seus principais beneficiários seriam os habitantes dos países de Leste (porque são mais pobres), logo ajudariam a quebrar esse elo da corrente neo-liberal (até agora, os novos membros têm sido os principais opositores da harmonização fiscal) e a juntar num mesmo combate os países pobres e os pobres dos países ricos.


Poder-se-á argumentar – “mas isso já está a ser feito! Há muitas propostas para alterar a ‘Constituição’ para incluir direitos sociais”. Na minha opinião, pôr “direitos sociais” na Constituição não serve de nada – basta ler a constituição portuguesa. O que é preciso é lutar – à escala europeia – por politicas concretas. No dia em que houver uma greve geral europeia (uma greve a sério, não uma greve folclórica de 5 minutos, ou coisa assim) por uma reivindicação comum, aí poderemos falar de uma verdadeira “União Europeia”.


É que o tempo urge – na realidade, os “eurocratas” têm razão quando dizem que a construção europeia, se não avançar, vai abaixo: neste momento, vai ser necessário fazer uma nova proposta de tratado, que terá que ser, ou mais, ou menos federalista que a anterior (conforme os “nãos” a que se quiser agradar). Assim, ou se avançará para uma “Europa Social”, ou, possivelmente, assistiremos ao principio do fim da UE (pelo menos, na sua dimensão actual) o que poderá até levar a uma vaga fascista nalguns países, como a Bélgica ou a Holanda (bem, talvez eu esteja a ser um pouco catastrofista neste ponto).

[MIGUEL MADEIRA]

6.24.2005

STANDING ON THE SHOULDER OF GIANTS IV



O sistema de lucro e comércio, de exploração humana e de propriedade, produz, muito mais rapidamente do que o aumento da população, uma divisão da sociedade contemporânea que a velha sociedade é incapaz de sanar, porque ela nunca sana ou cria, mas apenas existe e goza. A existência de uma humanidade sofredora que pensa e uma humanidade pensadora que é oprimida deve necessariamente ser desagradável e inaceitável ao mundo animal dos filisteus que nunca agem nem pensam mas apenas gozam.

Por nosso lado o velho mundo deve ser trazido à luz do dia e deve ser dada uma forma positiva ao novo. Quanto mais tempo os acontecimentos concederem à humanidade sofredora para se reunir, mais perfeito será o produto que o tempo atual leva em seu ventre.

[KARL MARX]

NÃO ESQUECEREMOS NOSSOS MORTOS!



Uma certa madrugada
Eu por um caminho andava
Não sei bem se estava bêbedo
Ou se tinha a morte n’alma
Não sei também se o caminho
Me perdia ou encaminhava
Só sei que a sede queimava-me
A boca desidratada.
Era uma terra estrangeira
Que me recordava algo
Com sua argila cor de sangue
E seu ar desesperado.
Lembro que havia uma estrela
Morrendo no céu vazio
De uma outra coisa me lembro:...
Un horizonte de perros
Ladra muy lejos del río...


De repente reconheço:
Eram campos de Granada!
Estava em terras de Espanha
Em sua terra ensangüentada
Por que estranha providência
Não sei... não sabia nada...
Só sei da nuvem de pó

Caminhando sobre a estrada
E um duro passo de marcha
Que eu meu sentido avançava.
Como uma mancha de sangue
Abria-se a madrugada
Enquanto a estrela morria
Numa tremura de lágrima
Sobre as colinas vermelhas
Os galhos também choravam
Aumentando a fria angústia
Que de mim transverberava.


Era um grupo de soldados
Que pela estrada marchava
Trazendo fuzis ao ombro
E impiedade na cara

Entre eles andava um moço
De face morena e cálida
Cabelos soltos ao vento
Camisa desabotoada.
Diante de um velho muro
O tenente gritou: Alto!
E à frente conduz o moço
De fisionomia pálida.
Sem ser visto me aproximo
Daquela cena macabra
Ao tempo em que o pelotão
Se punha horizontal.


Súbito um raio de sol
Ao moço ilumina a face
E eu à boca levo as mãos
Para evitar que gritasse.
Era ele, era Federico
O poeta meu muito amado
A um muro de pedra-seca
Colado, como um fantasma.
Chamei-o: Garcia Lorca!
Mas já não ouvia nada
O horror da morte imatura
Sobre a expressão estampada...
Mas que me via, me via
Porque eu seus olhos havia
Uma luz mal-disfarçada.


Com o peito de dor rompido
Me quedei, paralisado
Enquanto os soldados miram
A cabeça delicada.


Assim vi a Federico
Entre dois canos de arma
A fitar-me estranhamente
Como querendo falar-me
Hoje sei que teve medo
Diante do inesperado
E foi maior seu martírio
Do que a tortura da carne.
Hoje sei que teve medo
Mas sei que não foi covarde
Pela curiosa maneira
Com que de longe me olhava
Como quem me diz: a morte
É sempre desagradável
Mas antes morrer ciente
Do que viver enganado.


Atiraram-lhe na cara
Os vendilhões de sua pátria
Nos seus olhos andaluzes
Em sua boca de palavras.
Muerto cayó Federico
Sobre a terra de Granada
La tierra del inocente
No la tierra del culpable.
Nos olhos que tinha abertos
Numa infinita mirada
Em meio a flores de sangue
A expressão se conservava
Como a segredar-me: A morte
É simples, de madrugada...


[VINICIUS DE MORAES]

6.15.2005

A CONSTRUÇÃO DOS MITOS

A morte saíu à rua num dia assim. De repente, três grandes homens deste nosso Portugal deixaram de nos fazer companhia: o general Vasco Gonçalves, o poeta Eugénio de Andrade e Álvaro Cunhal. Muito haveria a dizer sobre cada um deles, mas queria neste post centrar-me na figura de Cunhal.

A notícia da sua morte deixou-me bastante abalado. Apesar de não ser "comunista" no sentido de "membro do Partido Comunista" (considerando no entanto, ao contrário do que dizia Estaline, haver de facto comunistas fora do partido, porventura até mais do que no seu interior...), senti, como creio que terá sentido qualquer homem ou mulher de esquerda, uma perda com o desaparecimento deste grande homem, responsável mais do que qualquer outro pela edificação de uma estrutura política organizada de forma tão competente que foi capaz de fazer frente, durante décadas, à tirania do fascismo salazarista. Se o fascismo foi derrubado, muito o devemos à sua luta, à sua resistência, à sua abnegação. O que não quer dizer que no essencial Cunhal não tenha estado do lado errado da história.

A morte é sempre algo de trágico e doloroso. Mas tem o seu quê de irónico. Quando morre um homem ou uma mulher, todas as delcarações a seu aspecto são elogiosas, mesmo vindas dos maiores inimigos. Por outro lado, quando a pessoa em causa foi uma personalidade maior e marcante, como é incontestavelmente o caso de Cunhal, a sua memória e figura são desde logo disputadas, canibalizadas, manipuladas. E isto dos mais diversos ângulos.

Assim, ontem os editorialistas e colunistas afinaram praticamente todos pelo mesmo diapasão: Cunhal foi um grande homem, um grande resistente anti-fascista, mas tinha um modelo de sociedade que daria necessariamente numa ditadura. Porque a única forma de sociedade viável é mesmo uma que se reja pela democracia parlamentear representativa e pela sociedade de mercado liberal. Morrendo um "comunista", há que enterrar com ele os ideiais emancipatórios do Comunismo. Fukuyama Reloaded

A outra postura foi a hagiográfica: a elevação do homem a uma figura mítica, algo que já há muito se vinha a fazer, mas que agora com a sua morte se fará ainda mais. A memória dos mortos é de que a apanhar. Se figuras carismáticas vivas dão força a um movimento político ou religioso, os mortos e os mártires dão muito mais. O PSD tem Sá-Carneiro, o PCP agora tem Álvaro Cunhal.

No meio de isto tudo, é muito difícil estabelecer o rigor histórico e fazer ouvir uma opinião diferente. Mas há que dizê-lo, Cunhal estava politicamente errado. Não por ser comunista, como o dizem os comentadores reaccionários e burgueses, mas por ser estalinista, por ter apoiado sempre a casta dirigente que usurpou o poder após a Revolução de Outubro, que aniquilou milhões de pessoas entre as quais a maioria dos quadros dirigentes responsáveis pela própria Revolução. Por ter apoiado as manobras imperialistas do Estado Soviético, o esmagamento militar da Primavera de Praga, a lei marcial na Polónia, a invasão do Afeganistão.

Ao contrário do que se diz, Cunhal soube dar as cambalhotas que foi preciso dar para parecer que esteve sempre no mesmo lugar. Cunhal manobrou quando foi preciso manobrar e denunciou quando achou tal necessário, condenando por divergências políticas camaradas de luta à prisão e à tortura por parte da PIDE, prisões e torturas essas que ele tão bem conhecia.

Acerca disto, revejo-me por completo nas palavras do grande e sempre lúcido Francisco Martins Rodrigues ( no artigo publicado ontem no Público, e que por não estar disponível on-line passo a transcrever:

Um progressista de vistas curtas

No momento da morte de Álvaro Cunhal, não vou juntar-me às expressões de "profundo pesar" institucional que chovem de todos os lados, sobretudo dos seus adversários políticos. Muito menos às frases feitas sobre a sua dureza, ambição, modéstia ou imodéstia, etc. Acho que o peso da sua figura merece uma apreciação política séria.

Em primeiro lugar, não posso acompanhar os elogios das figuras gradas a este regime à "coerência" do falecido - elogios que apenas reflectem o desconforto perante um homem qye chefiou a longa resistência dos comunistas à ditadura fascista e que, só pela sua presença, lhes atirava à cara a vergonha de não terem feito o mesmo quando era preciso provar o amor à "democracia" que estão sempre a proclamar.

Apesar do seu valor como antifascista, coerência é justamente a qualidade mais problemática na carreira política de Álvaro Cunhal. Ele foi, como todos sabem, admirador fervoroso da grande revolução conduzida por Lenine, mas também das misérias que vieram depois, com Estaline, Krutchov, Brejnev... até ao miserável desabar da URSS. E nunca explicou o que o levara a julgar socialista um país onde os trabalhadores eram arregimentados.

Pior ainda a sua "coerência" na política interna: depois de ter apelado ao longo de décadas à "revolução", quando esta finalmente começou a desenhar-se passou a bradar contra os "actos irresponsáveis". Pode dizer-se com justiça que Álvaro Cunhal contribuiu para fazer abortar a revolução que se esboçava em 74/75 no miserável forrobodó que por aí vai. Os burgueses que o pintavam como um diabo vermelho bem lhe podem agradecer o favor que lhes fez.

Nesse caso, porque teimam mesmo assim em acusá-lo de que quis "tomar o poder"? Naturalmente, porque precisam de ter uma justificação para o infame golpe militar de 25 de Novembro. E sobretudo, porque, habituados a ver o movimento de massas como uma marioneta nas mãos dos políticos, confundem o avanço irreprimível dos trabalhadores com planos tenebrosos da cúpula do PCP - a qual, na realidade, apenas se limitou a seguir a reboque da onda popular.

Promovem-no agora também a "homem de cultura". Para além do mérito que tenha a sua produção literária e artística, acho difícil reconhecer valor cultural a um líder político que instituiu no seu partido o clima da ortodoxia, da aceitação obediente e do medo à crítica e que, pela extrema pobreza do seu pensamento político, formou toda uma escola de militantes convictos de que o marxismo é uma colectânea de fórmulas sagradas.

Álvaro Cunhal fica na história de Portugal não como revolucionário (que nunca foi) mas como um anti-imperialista e um progressista de vistas curtas, que conseguiu a proeza de, sem se desacreditar perante os trabalhadores, poupar à burguesia o calvário de uma revolução. Nestes últimos 30 anos, o prestígio da sua carreira de resistente antifascista já não era suficiente para apagar a falência de toda a sua política e os custos que acarretou para os explorados.

Toda a sua vida foi passada na busca de um meio-termo, capaz de acalmar a indignação dos pobres sem atemorizar as classes médias. Não é uma qualidade honrosa para quem se reivindicou do título de comunista.

CARCAVELOS, RIO DE JANEIRO

Então começando por ordem cronológica: houve um estrilho na sexta-feira na praia de Carcavelos. A imprensa achou por bem entrar em histerismo total. De facto, todos os anos por esta altura do ano as notícias começam a escassear, e os jornalistas têm que dominar a arte do "chouriço". O que não é nada fácil. Muito mais fácil é, a partir de uns incidentes - que de facto foram graves, ninguém aqui diz o contrário - inventar um "arrastão" à brasileira efectuado por um exército de milhões recrutados nos "bairros perigosos".

As pessoas estão assustadas. Têm motivos para estar. Mas, desorientadas e assustadas, não vêm outra resposta que não a imediata. Mais polícia. Por cada indivíduo, dois polícias, armados com equipamento state of the art. E depois neste contexto singram as ideias imbecis. Vemos então como a extrema-direita, que têm andado num processo muito underground de reorganização, já se dá a mostrar. Ao que parece está marcada uma manifestação para este fim-de-semana no Martim Moniz.

É de facto preciso dar uma resposta a este clima social que origina fenómenos como o de Sexta-feira passada. Mas essa resposta não pode de forma alguma passar por reivindicações tão reaccionárias como o aumento da presença das forças repressivas do Estado no nosso dia-a-dia. Nem tão pouco pela criminalização das comunidades imigrantes como um todo.

Não podemos atacar apenas os sintomas e deixar de identificar e atacar a sua origem. Aquilo que aconteceu na sexta feira é um sintoma deste sistema capitalista que rege as nossas vidas.

Efectivamente, muito se poderia escrever acerca de como Carcavelos condensa em si todo um conjunto de contradições e desequilíbrios da sociedade portuguesa contemporânea. Filhos d@s trabalhador@s imigrantes que ergueram este país nos anos do seu maior crescimento económico, vivem em condições precárias, sem qualquer tipo de expectativas, mas sujeitos ainda assim à propaganda da sociedade de consumo. És o que tens. A hierarquização social associada à posse e ao uso de sinais exteriores de riqueza. Reparem como são tão felizes e sorridentes todos os que aparecem nos anúncios da Nokia e da Nike...

Certo, esta abordagem é redutora e simplista, mas não deixa de ter a sua validade. No entanto, se queremos resolver os problemas, há que analisá-los a fundo. Noutros países, muitos estudos foram já feitos, no âmbito das diversas Ciências Sociais, abordando a temática da criminalidade e das relações inter-étnicas, levando em linha de conta toda a complexidade do fenómeno. Era tempo de em Portugal se apostar nisso. Há imensos Cientistas Sociais sub-empregados, há imensos estudos que ficam a acumular pó nas bibliotecas, em vez de servirem para orientar a intervenção sobre os problemas concretos.

Temos que estudar mais, melhor e mais a fundo os fenómenos. Mas aquilo que sabemos já nos permite fazer exigências concretas. Não é com medidas racistas, xenófobas e securitárias que iremos conseguir resolver os problemas. É necessário actuar em todo um conjunto de áreas. É necessário, em primeiro lugar, dotar o Estado de meios de intervenção, de recursos materiais. E no actual contexto de défice montsruoso, isto passa por fazer uma limpeza a fundo de toda a máquina do Estado.

É preciso uma auditoria profunda, saber com o mais absoluto rigor quanto se gasta, onde se gasta, em que se gasta. Saber onde é que há gastos supérfluos que visam apenas alimentar clientes e amigos, para negociatas obscuras, e onde é que há falta de dinheiro para coisas essenciais. Por outro lado, urge acabar com o ragabofe fiscal. O fim do segredo bancário é uma medida essencial para restablecer a justiça social e acabar com a fraude. Quem não deve não teme.

Para além disso, outras exigências devem ser postas em cima da mesa: habitação de qualidade e equipamentos sociais; planeamento democrático do espaço público; trabalho estável e com direitos, contra a precarização e destabilização total das vidas; a legalização das drogas e separação de mercados como condição sine qua non de um combate realmente efectivo ao narco-tráfico; legalização e nacionalização de todos os imigrantes. Não nos deixemos levar pelas conversas e argumentos da extrema-direita. A luta não é entre quem é "Português" e branco e quem não o é. A luta é entre quem explora o trabalho e acumula fortunas e todos os outros, a quem são impostas existências na corda bamba, sem direitos e sem expectativas. A luta é contra o capital, contra a exploração,contra as classes exploradoras, contra as opressões. Por uma sociedade socialista, pós-capitalista, em que tod@s tenhamos um papel, que não se alimente da exclusão de fatias crescentes da sua população.

Um outro mundo é possível. Temos é que ser tod@s nós a construí-lo.

BACK TO THE REAL WORLD

Aproveita uma pessoa o fim-de-semana prolongado para se isolar do mundo, e quando volta está o mundo ao contrário




6.10.2005

REMENDOS E CÔDEAS

Sempre que se rompe o casaco do povo
Aparecem uns doutores que descobrem
Que assim não pode ser
Há que achar remédio
Seja lá como for

Vão então negociar com os senhores
Enquanto cá fora os trabalhadores
Ao frio esperam que eles voltem triunfantes com
Um belo remendo

Remendo sim pois bem mas onde é que ficou
O casaco todo?

Sempre que gritamos "basta temos fome!"
Aparecem uns doutores que descobrem
Que assim não pode ser
Há que achar remédio
Seja lá como for

Vão então negociar com os senhores
Enquanto cá fora os trabalhadores
Cheios de fome até que voltem triunfantes com
Uma bela côdea

Côdea sim pois bem mas onde é que ficou
A carcaça toda?

Nós não precisamos só desses remendos
Precisamos do casaco por inteiro
Nós não queremos ficar só com essa côdea
Precisamos de comer o pão inteiro

Não nos basta que o patrão nos dê trabalho
Precisamos de mandar nas oficinas
Nos campos e nas minas
No poder de Estado
Disso é que precisamos

Mas o que é que essa gente tem para oferecer?
Remendos e Côdeas!

REMENDOS E CÔDEAS - JOSÉ MÁRIO BRANCO

SIDEBAR

Deu algum trabalho, mas está feito. A sidebar aqui ao lado foi actualizada com mais blogues e muitos mais sites. Creio não estar em erro a dizer que é mesmo a melhor parte do blogue!

Então aproveitem e cliquem por aí fora e descubram os diversos mundos que este mundo da internet tem dentro...

[SADIK]

6.09.2005

TINTIM E A LUTA DE CLASSES



Há uns tempos atrás, o meu amigo Rui Faustino, poeta contemporâneo responsável pela reinvenção do amor romântico teve a ideia de fazer umas pancartas para o 25 de Abril com a imagem do Capitão Haddock e o lema "O Capitão Ad Hoc vive na Luta do Povo". Uma coisa integrada num dos projectos artísticos que brotam incessantemente daquela mente imaginativa, que até deu fotografia na revista do Expresso e um registo filmográfico do Marocas a segurar na pancarta e a olhar com cara de parvo para aquilo. Não sei em que pé está o projecto agora, mas de facto o enredo era, no mínimo criativo. O recurso à figura do Capitão das aventuras do Tintim era particularmente engraçado, na medida em que qualquer pessoa que tenha lido o Tintim no País dos Sovietes com alguma atenção verá como o seu autor estava muito longe mesmo de partilhar de simpatias com qualquer tipo de "Lutas do Povo".

Venho falar disso agora porque encontrei há alguns dias atrás, de forma completamente acidental e inesperada, enquanto fazia uma pesquisa qualquer por já nem me lembro bem o quê, este sítio. Trata-se de um site de um camarada francês, ao que parece da LCR, através do qual podemos ter acesso a esta excelente banda desenhada.

A primeira coisa que nos é dita acerca dela é que se trata de uma história com um "Tintim Revolucionário". Mais do que o suficiente para cativar a atenção e a curiosidade de qualquer navegante militante sem muito que fazer. Era o meu caso, pelo que debrucei-me sobre a leitura. Comecei por entretenimento e por mera diversão, mas à medida que as páginas iam passando e o enredo se ia desenvolvendo, cheguei à conclusão que estava perante uma obra de imensa qualidade. De uma forma extremamente inteligente e bem-conseguida, o autor conduz-nos ao longo de um de um processo de agitação social revolucionária. Todas as questões acerca das quais gastamos linhas a escrever em textos teóricos são abordadas nas vinhetas de forma muito pedagógica: da questão da luta de classes mais básica entre @s trabalhador@s e os capitalistas, à questão do Racismo e Anti-Fascismo, do Sexismo e da Homofobia, passando pelo funcionamento burocrático e contra-revolucionário das direcções sindicais e pelo debate em torno da táctica e estratégia a adoptar para o triunfo no cofronto com o poder, tudo isso está brilhantemente integrado na acção.

Na medida em que se tratam de obras que, sem se perderem em reflexões teóricas, conseguem nos dar uma visão concreta e abrangente de todo um conjunto de problemas e contradições inerentes ao capitalismo, posso dizer que esta BD, em conjunto com o filme da Naomi Klein The Take, sobre a crise argentina e o movimento da ocupação e gestão operária das fábricas, foram, a nível político, das coisas mais interessantes que pude respectivamente ler e ver. Porque às vezes é melhor coisas dessas, que nos confrontam directamente com a prática e com o concreto, que nos obrigam a desenvolver a nossa própria análise e reflexão política, do que páginas de textos de autores de renome com as suas teorias muito bem desenvolvidas e delineadas.

Espero que sigam a minha sugestão e leiam esta obra-prima. Estou certo que se o fizerem ficarão como eu fiquei, com imensa vontade de discutir com alguém mais que tivesse lido. É para isso que serve a caixa de comentários abaixo...


AS NOSSAS VIDAS NÃO VOS PERTENCEM!



O Bloco de Esquerda está a organizar uma comitiva para participar nas acções de contestação à cimeira do G8 na Escócia. Mais informação aqui.


DA DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHO

Um sistema de democracia representativa teria sido mais prudente. Veja-se um rapaz que trabalha todo o dia numa fábrica perto de Nancy. Ele regressa a casa tarde. Eu digo-vos que ele tem vontade de beber uma cerveja, ele não vai ler a Constituição em pormenor. Para que serve o Parlamento?

Claude Imbert, editorialista do Le Point, sobre o referendo à Constituição Europeia em França, citado aqui.


O DIA SEGUINTE

É o caos? A Europa implode?

Não, claro que não. A construção europeia foi demasiado longe para poder ser posta em causa pelo chumbo de um Tratado voluntarista.

A 30 de Maio vira-se, isso sim, uma página: a de uma Europa construída por cima das opiniões públicas europeias. Nessa segunda feira, as lideranças terão de encarar de frente este divórcio. Não podem mais fingir que ele não existe.


II ACAMPAMENTO D@S JOVENS DO BE



De 27 a 31 de Julho S. Gião, Serra da Estrela, vai ser um espaço revolucionário, aberto a tod@s, sejam ou não do Bloco. Um lugar privilegiado para pôr em comum experiências contra a corrente, exercer o direito ao sonho e trocar ideias para mudar a vida. Um lugar à tua espera.



Esta esquerda jovem e combativa aqui está: para juntar activismo e devolver a esperança. Para romper com o capitalismo e construir um outro dia-a-dia. O acampamento é o espaço onde essa alternativa acontece. Contigo.


O preço geral do acampamento inclui a participação em todas as actividades do acampamento (debates, workshops, noites), três refeições por dia, seguro e transporte de ida e volta: 50€.

Para quem não puder ir todos os dias, o preço é o seguinte: 10€ por dia. E mais 10€ no caso de utilizarem os transportes organizados pelo Bloco.

INSCRIÇÕES E OUTRAS INFORMAÇÕES:
Aveiro 932311996
Braga 968598365
Coimbra 968208989
Covilhã 962445442
Évora 964214254
Guarda 914725450
Ribatejo 916004995
Viseu 963101878
Porto 222002851/ 919127035
Lisboa e resto do país 213510510

CRISE ORÇAMENTAL: AUSTERIDADE EM ROSA CHOQUE

O suposto desconhecimento sobre o tamanho do défice foi usado por Sócrates como desculpa para atacar os mais fracos, os funcionários públicos, os reformados. O Bloco apontou imediatamente alternativas para que não paguem “os culpados do costume”.

Apesar de toda a encenação montada pelo governo, com a ajuda de Vítor Constâncio no Banco de Portugal, o tamanho do buraco nas contas públicas já era bem conhecido. Quem se esquece da cara de Bagão Félix e Santana Lopes quando a Comissão Europeia desmentiu os seus truques orçamentais?



Sócrates diz agora que foi surpreendido ao saber que o défice pode chegar a 6,8% do produto interno. E que assim não pode respeitar a promessa eleitoral de não aumentar impostos sobre quem trabalha. Ora, o IVA é o mais injusto dos impostos, aumentando directamente o custo de vida de quem menos tem. Pior: faltando à palavra dada, Sócrates prejudica o consumo, agravando a recessão e o desemprego.



Governo prefere dinheiro fácil
Em vez de uma reforma fiscal, com garantias de combate à fraude e à fuga, Sócrates preferiu aumentar impostos indirectos (IVA, combustíveis, tabaco). Mas estes penalizam sobretudo os mais pobres. Segundo o governo, metade do consumo de cada família será afectado pela subida do IVA de 19% para 21%. Ainda há três anos este imposto se situava nos 17%.



Ao procurar soluções rápidas e fáceis, o governo esquece o essencial: reduzir o desemprego e conter as injustiças sociais. Durante a campanha eleitoral, o Partido Socialista manteve perigosos silêncios sobre opções fundamentais da sua governação. José Sócrates foi então apoiado pelos sectores mais poderosos da sociedade mas conquistou a maioria ao concentrar as expectativas de mudança da maioria da população. Agora, Sócrates escolhe o seu lado. Cortando em despesas necessárias e cobrando impostos injustos, o governo passa a factura da crise aos mais fracos.



Bloco propõe outros caminhos
O governo anunciou uma medida correcta, há muito defendida pelo Bloco: a criação de um escalão de IRS, de 42%, para rendimentos superiores a 60 mil euros. Mas essa medida não muda o essencial: são os trabalhadores – e particularmente os da Função Pública que pagarão o descalabro das contas.

Mas há outro caminho para equilibrar as contas: em primeiro lugar, combater o desperdício na administração, com uma auditoria rigorosa e eficaz. Em vez disso o governo anunciou uma série de auditorias dispersas ao longo do tempo (as despesas de alguns ministérios só serão estudadas no final do mandato do governo), deixando de fora autarquias, institutos públicos, a segurança social, etc.



Em segundo lugar, levantar o segredo bancário de forma sistemática, para detectar crimes fiscais e de corrupção, narcotráfico, etc. Em vez disso, o governo anuncia que definirá “situações de risco” em que o fisco pode consultar contas bancárias. Assim, em vez de detectar crimes que roubam milhões aos cofres do Estado, só se pode confirmar suspeitas existentes.



Em terceiro lugar, o Bloco propõe a criação de um imposto de solidariedade sobre as grandes fortunas. Este imposto existe em numerosos países. Em Portugal, ele permitiria arrecadar entre 250 e 350 milhões de euros, tributados aos donos de fortunas acima de 934 mil euros (2500 salários mínimos). Para haver justiça, é necessário coragem para fazer pagar mais aqueles que têm mais.

JÁ AÍ ESTÁ



O nº5 do ESQUERDA. Podes lê-lo à pala em pdf aqui.

6.08.2005

O ÚNICO CRIME SÃO AS VOSSAS LEIS



O REBELDE está solidário com @s camaradas do Paradiso Ocupado.

CHAMAR OS BOIS PELOS NOMES

A ver, no site oficial do Bloco de Esquerda a declaração política de Francisco Louçã e a troca de argumentos - se é que da outra parte podemos considerar aquilo argumentos - com os deputados da direita, Nuno Melo (PP) e Marques Guedes (PSD)



Imagem tirada do site do Banco Mundial - They know what they're talking about...



POLITICAMENTE CORRECTO?

Leituras na blogosfera em torno da problemática do politicamente correcto:

"Sob as pedras da calçada,... nada." n'Os Tempos Que Correm (do camarada Miguel Vale de Almeida);

"Cambalhotas" no Renas e Veados.

Em contraposição a esta abordagem, o colectivo que elevou o humor a um outro patamar escreveu alguns postes em que não apenas se faz humor como se reflete sobre essa prática: 1, 2, 3, 4, 5 . Leiam e perceberão porque me dei ao trabalho de ir vasculhar aos arquivos...

[SADIK]

5.29.2005

FRANÇA DIZ NÃO !

Finalmente chegou o tão esperado dia! Ao longo das últimas semanas tenho acompanhado o resultado das variadas sondagens e das discussões que têm sido feitas em torno da questão do referendo em França. Hoje, tivemos a confirmação da tendência que nos era dada pela generalidade das sondagens: A França, um dos principais pilares da União Europeia, rejeitou via referendo a ratificação do Tratado que institui uma Constituição para a Europa. Apesar da forte mobilização de personalidades europeias, já na recta final da campanha, a favor do "sim", não se conseguiu inverter a tendência do "não" bem patente no eleitorado francês.
Tão ou mais importante que verificar a vitória do "não", é saber o que constitui o "não" e quais as consequências daí retiradas. Pessoalmente, eu sou pelo "não". Sou pelo "não" porque não acredito que seja esta a Constituição que eu quero para a Europa, não a uma Constituição feita à medida daqueles que não têm a mesma ideia de Estado social que eu tenho, não a uma Constituição que pactua com o sistema económico capitalista e com as políticas neo-liberais.
É importante olhar bem para quem compõe o "não" em França, e perceber que a vitória obtida pelo "não" não foi feita unicamente por pessoas com o meu pensamento. Nos últimos dias dei-me conta das várias opiniões existentes por detrás do "não": pessoas que votam "não" pelo seu exacerbado nacionalismo, por serem simplesmente contra a existência da U.E.; pessoas que apesar de não serem nem bem a favor da U.E. nem contra, são contra aqueles que consideram que lhes tiram o emprego, e assim demonstram o seu descontentamento no referendo; pessoas que se dizem de esquerda e que ainda não perceberam a importância do processo de construção europeu, rejeitando apenas mais um passo nesta construção; e pessoas de outra face da esquerda que, estando integrados no processo de construção europeu consideram que esta Constituição não deve ser um dos passos a tomar (onde eu me incluo).
Eu apoio, sem dúvida, a construção de uma União Europeia, na qual, apesar das diferenças culturais existentes no seu seio - que devem ser respeitadas -, os países se devem unir para que possam, entre si, construir uma sociedade mais socialista, mais preocupada com um desenvolvimento da economia atento ao ponto de vista social, no qual se pauta pela qualidade de vida das pessoas, e não um desenvolvimento da economia à custa da exploração de muitos. Sendo assim, se uma Constituição tiver que ser um dos meios para chegar a este objectivo, eu sou a favor de uma Constituição para a Europa. Mas, tal como já disse, esta não é a Constituição que eu quero...
Apesar de defensor do "não" a esta Constituição, não posso deixar de verificar as consequências retiradas do resultado de hoje: Atento às notícias, verifico já que a extrema-direita francesa aproveita o momento para ganhar terreno face à direita que está no poder e face aos sectores de esquerda que não estão em união total neste momento, principalmente os socialistas, que se encontram completamente desbaratados pela sua divisão de opiniões nesta matéria; A Comissão Europeia não coloca a hipótese de travar o processo de ratificação do Tratado, tendo uma réstia de esperança num plano B que possa surgir entretanto; Muito do sentimento de união presente na generalidade dos cidadãos europeus será abalado, e daqui em diante mais frequentemente se porá em causa o processo de construção de uma Europa unida; Por fim, com um pouco de sarcasmo da minha parte, considero que os nossos caros amigos americanos devem esfregar as mãos de contentes...